Muitas empresas, sobretudo do ramo de Engenharia Civil, procuram este Escritório para fins de esclarecimentos sobre a possibilidade (ou não) de serem realizados procedimentos licitatórios durante a vigência do período eleitoral, uma vez que, na maioria das vezes, dependem de tais procedimentos para manter o seu objeto social ativo.
Importante mencionar, de antemão, que o questionamento é bastante aberto, devendo ser analisado cada caso concreto para respostas precisas e assertivas. Contudo, de maneira geral, já é possível afirmar que não há legislação que vede totalmente a realização de procedimento licitatório durante a vigência do período eleitoral.
Pensemos: há serviços básicos e essenciais que não podem ser interrompidos. A exemplo cita-se a compra de medicamentos ou alimentos para escolas públicas. Sem falar na contratação de serviços emergenciais, que muitas vezes acontece por razões repentinas e sem previsão.
O que ocorre (e aqui encontra guarida o receio das empresas) são algumas ressalvas e alguns limites quanto aos procedimento licitatórios realizados durante este período, os quais são regulamentados pela Lei nº 9.504/1997 (que estabelece as normas para as eleições), como, por exemplo, a do artigo 73, que destaca as condutas dos agentes públicos no ano de eleição ou nos três meses que antecedem tal acontecimento:
Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:
VI – nos três meses que antecedem o pleito:
a) realizar transferência voluntária de recursos da União aos Estados e Municípios, e dos Estados aos Municípios, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados os recursos destinados a cumprir obrigação formal preexistente para execução de obra ou serviço em andamento e com cronograma prefixado, e os destinados a atender situações de emergência e de calamidade pública;
VII – empenhar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da administração indireta, que excedam a 6 (seis) vezes a média mensal dos valores empenhados e não cancelados nos 3 (três) últimos anos que antecedem o pleito;
Neste mesmo sentido há a Lei Complementar nº 101/2000 (que estabelece as normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal) que determina que não pode ser contraída obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro do mandato atual e em vigência:
Art. 42. É vedado ao titular de Poder ou órgão referido no art. 20, nos últimos dois quadrimestres do seu mandato, contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para este efeito.
Tal artigo de lei não se trata de uma vedação ou de um impedimento total, mas sim de um limite, sendo, em outras palavras, o de que a Administração até pode contratar, desde que (e aqui está configurado o limite/restrição) tenha recurso disponível dentro do mandato atual e em vigência para o pagamento da obrigação do objeto do procedimento licitatório realizado.
Os próprios Tribunais de Contas já regulamentaram a matéria sobre a possibilidade de ser realizada licitação no período eleitoral, citando-se como exemplo a Resolução do Tribunal de Contas do Estado do Paraná nº 3.765/2004, a qual dispõe, de forma resumida:
“I – Responder a presente Consulta, nos termos do voto escrito, pela possibilidade de a administração realizar contratos que ultrapassem o mandado do Prefeito municipal, em face do dispositivo no art. 42 da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF, não existindo restrição para as despesas não liquidadas ou de obrigações a serem verificadas e exigíveis em exercícios financeiros posteriores, desde que haja disponibilidade de caixa suficiente para pagamento das parcelas vincendas no exercício. II – As disponibilidades de caixa representam a existência de valores suficientes para o pagamento de encargos e despesas compromissadas até o final do exercício, incluindo-se as geradas dentro do próprio exercício e as remanescentes de anteriores.”
Assim sendo, entende este escritório, de maneira geral, que não há vedação total sobre a possibilidade de ser realizado procedimento licitatório durante o período eleitoral. O que passa a existir no referido período são limites e restrições, sobretudo no que diz respeito a ser contraída uma dívida que somente pode ser quitada com o orçamento da gestão atual (o cerne da situação gira em torno, em suma, de questões orçamentárias), sob pena de incorrer em prejuízo para a Administração, ou seja, prejuízo para a própria população.
PRISCILA JARDIM MAURÍCIO GAZEN
OAB/RS 126.157 OAB/RS 71.456