TCU pode desconsiderar personalidade jurídica e estender efeitos da inidoneidade?

Desde o julgamento do Acórdão 495/2013, o TCU entende que a declaração de inidoneidade recai apenas sobre a empresa licitante. Por ausência de disposição legal, os efeitos da inidoneidade não poderiam ser aplicados a sócios e administradores – inviável, portanto, a desconsideração da personalidade jurídica na jurisdição de contas.

Mas para evitar que os sócios e administradores fugissem dos efeitos da inidoneidade pela constituição de nova empresa, o TCU desenvolveu raciocínio visando a evitar fraude à sanção de inidoneidade. Caso qualquer dos sócios ou administradores de empresa constitua nova pessoa jurídica com o mesmo objeto, após a sanção e durante a sua vigência, devem ser tomadas as providências necessárias para inibir a participação desta nova empresa em certames. Visando maior efetividade, o TCU entende que esta restrição abrange também empresas de parentes até o terceiro grau dos sócios e administradores das empresas declaradas inidôneas.

Mais recentemente, a legislação passou a dispor sobre a extensão dos efeitos da inidoneidade a terceiros. Pela Lei das Empresas Estatais, de 2016, empresas cujos sócios e administradores tenham integrado o quadro societário de licitante inidônea não podem participar de licitação ou serem contratadas pelo Poder Público (art. 38). Viram “profissionais radioativos[1]”. Agora em 2021, a Nova Lei de Licitações previu uma nova hipótese de desconsideração da personalidade jurídica e os isótopos radioativos da inidoneidade podem alcançar administradores e sócios com poderes de administração (art. 160).

No Acórdão 1761/2021, a pretexto da edição da Nova Lei de Licitações, suscita-se interessante questionamento sobre o art. 160 autorizar o TCU a estender os efeitos da sanção a sócios e administradores de empresas declaradas inidôneas.

O TCU não tem competência para desconsiderar a personalidade jurídica e estender os efeitos da inidoneidade a terceiros. Além de não ser destinatário da Lei, o TCU não é expressamente indicado como titular desta competência. Competências, ainda mais de poder, não se presumem. O Estado de Direito não admite poderes implícitos para restringir, limitar ou condicionar direitos. Há uma grave falha de o Legislativo não indicar o responsável por tamanha competência – mais um exemplo de poder sem responsabilidade. Mas isso não significa que o TCU a detenha só porque assim supõe.

A extensão dos efeitos da inidoneidade a terceiros deve atender aos direitos previstos em lei: contraditório, ampla defesa e análise jurídica prévia (o que quer que isso signifique no processo judicial). Ainda, o princípio da culpabilidade previsto na Constituição determina que apenas os sócios e administradores que de fato participaram da fraude à licitação podem sofrer os efeitos da inidoneidade. Além da comprovação do dolo, deve-se considerar os elementos de dosimetria previstos na Nova Lei de Licitações e na LINDB (art. 22). Por fim, qualquer interpretação ampliativa da ocorrência impeditiva indireta, como para empresa de parente até o terceiro grau de sócios ou administradores inidôneos por irradiação, carece de fundamento jurídico.

Fonte: Jota.Info

Gazen Advogados

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