2. A autoridade que homologa o pregão deve, sob pena de responsabilização, verificar a existência de fundamentos na manifestação do pregoeiro pelo não provimento de recurso interposto por licitante, especialmente se houve contraposição às razões recursais apresentadas, em observância ao princípio da motivação (art. 2º da Lei 9.784/1999). Representação formulada ao TCU pela Procuradoria da República no Estado do Mato Grosso apontou possíveis irregularidades no Pregão Eletrônico 130/2015, promovido pelo Hospital Universitário Júlio Muller para a contratação de serviços de gerenciamento integrado de manutenção predial. Entre as irregularidades suscitadas, mereceu destaque a alegação de que a licitante vencedora não teria comprovado os requisitos de habilitação do certame, em decorrência da apresentação de atestados com as seguintes falhas: “a) indicação de prestação de serviços de natureza distinta, apesar de ambos fazerem referência ao mesmo contrato 25/2014 celebrado com o Hospital Universitário Júlio Muller; b) não atendimento ao item 8.6.2.1 do edital e aos itens 18.1, 18.2.4, 18.2.7.2 e 18.2.7.3, incisos VI e VII, do termo de referência; e c) os serviços indicados em um desses atestados não coincidiriam com o objeto do PE 130/2015”. Além disso, as planilhas de custos e formação de preços da vencedora indicavam custo zero de alguns insumos, adotavam percentuais indevidos de incidência tributária sobre determinados serviços e apresentavam BDI de forma distinta da exigida pelo termo de referência, assim como pelo art. 9º do Decreto 7.983/2013 e pela jurisprudência do TCU. No âmbito da unidade técnica, foi promovida a audiência do pregoeiro, pela “negativa de provimento ao recurso administrativo que teria apontado essas falhas”, além da do diretor-superintendente do hospital, pela “concordância com a decisão do pregoeiro e posterior homologação e adjudicação do objeto”. O pregoeiro não apresentou defesa, passando à condição de revel, nos termos do art. 12, § 3º, da Lei 8.443/1992. Em suas razões de justificativa, o diretor-superintendente argumentou, em síntese, que não possuía condições técnicas de identificar as irregularidades na documentação apresentada pela empresa vencedora, tampouco capacidade para “contrapor as conclusões do pregoeiro sobre a decisão de indeferir o recurso” contra a habilitação da referida empresa. Além disso, ponderou que agiu de boa-fé, sem dolo, ao homologar a decisão do pregoeiro e promover a adjudicação do objeto em favor da vencedora, até porque, segundo ele, os erros estariam ocultos e seriam de difícil percepção. Após examinar essas justificativas, a unidade técnica propôs considerar a representação parcialmente procedente, aplicar multa somente ao pregoeiro e dar ciência ao Hospital Universitário Júlio Muller sobre as falhas identificadas no aludido pregão. Em seu voto, discordando parcialmente da unidade instrutiva, o relator considerou que as razões de justificativa oferecidas pelo diretor-superintendente acerca da responsabilidade exclusiva do pregoeiro não deveriam ser acolhidas, pois “a falta de conhecimento técnico sobre o procedimento licitatório e o excesso de trabalho que lhe fora atribuído à época” não seriam suficientes para afastar a sua responsabilidade, além do que não se tratava de falha de difícil detecção praticada por subordinado, a lhe exigir “a análise de questões técnicas ou de elevado grau de complexidade, mas a mera verificação da existência de fundamentos que justificassem a negativa de provimento do recurso administrativo pelo pregoeiro, especialmente a contraposição aos argumentos especificados no recurso”. Segundo o relator, “as referidas decisões, do pregoeiro e da autoridade máxima, desrespeitaram o princípio da motivação que rege a Administração Pública, nos termos do art. 2º da Lei 9.784/1999”, além de contrariarem a jurisprudência do TCU, a exemplo do Acórdão 1467/2022-Plenário, do qual foi extraído o seguinte enunciado constante da ferramenta ‘Jurisprudência Selecionada’: “Em pregão, é necessária motivação das decisões que desclassifiquem propostas, inabilitem licitantes ou julguem recursos, com nível de detalhamento suficiente para a plena compreensão pelos interessados, em observância ao princípio da motivação ”. Na sequência, reforçando a manifestação da unidade técnica no sentido de que o pregoeiro teria incorrido em erro 3 grosseiro ao deixar de enfrentar as irregularidades especificadas no âmbito do recurso administrativo, sendo que, caso tivesse promovido a devida análise, não teria dificuldades em perceber a procedência do recurso, o relator concluiu que “não subsiste a possibilidade de acatar a justificativa da autoridade máxima de que confiou na análise técnica das razões recursais pelo pregoeiro, já que, na prática, a fundamentação da decisão do pregoeiro consistiu em meras justificativas de cunho essencialmente genérico, além de transcrições doutrinárias e legais atinentes às contratações públicas”. E arrematou: “Com efeito, ante a inobservância do dever de cuidado do gestor público, deve a referida autoridade ser responsabilizada por culpa in vigilando e culpa in eligendo pelos atos praticados por seu subordinado, conforme a jurisprudência consolidada do TCU”. Nesse sentido, invocou o Acórdão 973/2022-Plenário e deixou assente que o Tribunal “já se pronunciou sobre a responsabilidade solidária da autoridade homologadora pelos vícios nos procedimentos licitatórios, excetos os ocultos, não podendo esse controle ser considerado como ato meramente formal ou chancelatório”, destacando, a título de exemplo, os Acórdãos 505/2021 e 368/2022, ambos do Plenário. Ao final, acompanhando o voto do relator, o colegiado decidiu aplicar multa individual ao pregoeiro e ao diretor-superintendente do Hospital Universitário Júlio Muller, sem prejuízo de cientificar o órgão das seguintes irregularidades identificadas no Pregão Eletrônico 130/2015, a fim de evitar a sua repetição em futuras licitações: I) “ausência de motivação da decisão que nega provimento ao recurso administrativo por meio da contraposição das razões recursais apresentadas pela recorrente, em afronta ao art. 2º da Lei 9.784/1999 e à jurisprudência deste Tribunal”; e II) “a homologação da licitação e a adjudicação do objeto pela autoridade máxima sem a devida análise sobre a regularidade dos atos pretéritos praticados por seus subordinados, por consistir em ato de fiscalização, e não meramente formal ou chancelatório, conforme a jurisprudência do TCU”. Acórdão 4834/2022 Primeira Câmara, Representação, Relator Ministro Walton Alencar Rodrigues.