A previsão legal:
Lei 8.666/93 – Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
…
II – multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;
III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
IV – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes…
… “
Decorre a LEI, acima transcrita, o entendimento de que a sanção de suspensão do direito de licitar com a Administração Pública alcança apenas os órgãos e entidades subordinados hierarquicamente à autoridade que a aplicou, restrita, obviamente, à mesma esfera de governo, nos termos dos artigos 6, incisos XII, e 87, inciso III, da Lei de Licitações.
Para se evitar confusão importante distinguir a suspensão temporária e a declaração de inidoneidade em razão dos seguintes aspectos[1]:
- a) a suspensão temporária pode ser aplicada, conforme disponha os normativos internos do órgão ou entidade contratante, por qualquer gestor; a declaração de inidoneidade somente pode ser aplicada por Ministro de Estado ou por autoridade equivalente;
- b) a suspensão temporária será fixada em até dois anos ( no caso de Pregão até 5 anos) ; a declaração de inidoneidade não possui prazo certo. Todavia, decorridos dois anos da aplicação da declaração de inidoneidade, a empresa punida poderá pedir sua reabilitação;
- c) a suspensão temporária somente é valida e, portanto, somente impede a contratação da empresa ou profissional punido durante sua vigência perante a unidade que aplicou a pena; a declaração de inidoneidade impede a contratação da empresa ou profissional punido, enquanto não reabilitados, em toda a Administração Pública federal, estadual e municipal, direta e indireta
Refira-se que é uniforme na doutrina que a penalidade de suspensão, na Lei de Licitações, uma vez aplicada a algum licitante, pessoa física ou jurídica, restringe seus efeitos ao âmbito exclusivo daquela entidade que a aplicou, jamais podendo alguém pretender que aqueles efeitos possam ser estendidos para além dos limites daquela entidade.
Assim, por exemplo, se a sanção foi emitida por um órgão estadual, a mesma somente tem efeitos na esfera estadual, inexistindo impedimento a empresa continuar licitando em municípios ou órgãos federais no referido Estado. Da mesma forma se for entidade municipal ou estadual o sancionador. Por óbvio, se uma sanção pudesse ser estendida haveria uma intervenção indevida de u ente da federação em outro, ferindo a autonomia constittucional.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro, argumenta-se que:
O legislador, por óbvio, quis dar uma abrangência maior para a declaração de inidoneidade, sendo ilícito pensar que o contratado inidôneo assim o será perante qualquer órgão público do País. E aquele que for suspenso temporariamente será assim tratado perante os órgãos, entidades e unidades administrativas concernentes ao Poder Público que lhe aplicou a sanção.[1] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Temas Polêmicos sobre Licitações e Contratos. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 206-207.
Nessa discussão, Carlos Ari Sunsefeld emite o seguinte posicionamento:
As sanções de inidoneidade ou suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração devem ser impostas por agentes políticos da União, Estado, Distrito Federal ou Município, impedindo a contratação ou habilitação do apenado apenas pelos entes administrativos da mesma unidade federativa responsável pela aplicação da penalidade.[2]
No mesmo sentido, o mestre Hely Lopes Meirelles considera que:
A suspensão só opera efeitos em relação à Administração que a declara, pois sendo uma restrição a direito não se estende a outras Administrações. Assim, a declaração de inidoneidade feita pela União, pelo Estado ou pelo Município só impede as contratações com as entidades e órgãos de cada uma dessas entidades estatais, e se declarada por repartições inferiores só atua no seu âmbito e no de seus órgãos subordinados.[3]
Relevante trazer à lume posição esclarecedora emanada do TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, a qual vem ao encontro do antes já defendido neste recurso.
ACÓRDÃO nº 1.727/2006 – Primeira Câmara: (contrato, sanções, suspensão temporária, declaração de inidoneidade, distinção).
Na Auditoria levada a efeito na entidade, foi identificada, em alguns editais de licitação, cláusula proibindo a participação de empresas que estivessem cumprindo a penalidade de suspensão temporária, imposta por qualquer órgão da Administração Pública, motivadas pelas hipóteses previstas no art. 88 da Lei nº 8.666/93.
Segundo a unidade técnica, dispositivos dessa natureza afrontam o disposto no art. 87 da Lei nº 8.666/93, que prevê as penalidades aplicáveis às empresas por inexecução parcial ou total dos contratos celebrados, destacando-se aquelas constantes dos incisos III e IV, abaixo transcritas.
Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
(…)
III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
IV – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.
Consignou a equipe encarregada da fiscalização que a suspensão temporária de participação em licitação deve ser entendida como uma penalidade a ser cumprida apenas perante o órgão que impôs, sendo esse o entendimento já pacificado nesta corte, a exemplo do contido nas Decisões 369/1999, 226/2000 e 352/1998, todas do Plenário.
Consoante registrado na Decisão 352/1998 – Plenário, “o tribunal firmou entendimento de que as penalidades previstas na Lei se apresentam em escala gradativa de gravidade, deixando clara a intenção do legislador no sentido de disponibilizar ao gestor opções de sanções a serem aplicadas, levando-se em conta a infração cometida. Assim aplicar-se-ia uma pena mais branda para faltas não tão graves, suspendendo-se temporariamente o direito de licitar, e uma pena mais severa para aquelas faltas revestidas de maior gravidade, declarando-se inidôneo o licitante infrator”. Ressaltou, ainda a equipe de auditoria que a própria Lei nº 8.666/93, em seu art. 97, classifica como crime admitir a participação de licitante ou celebrar contrato com profissional ou empresa declarada inidônea, o que deixa claro a distinção entre os dois incisos.
Sendo assim, concluiu que “a Lei repudia, tão somente, a participação em licitação ou celebração de contrato com empresa apenada com a sanção de art. 87, inciso III (suspensão temporária), a Lei não faz qualquer objeção, o que confirma o entendimento de que a proibição em licitar ou contratar com pessoa apenada por este inciso restringe-se ao órgão que aplicou a pena e não a toda a Administração Pública”.
Ainda, cumpre salientar que a Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016) foi clara acerca do assunto:
Art. 83. Pela inexecução total ou parcial do contrato a empresa pública ou a sociedade de economia mista poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
I – advertência;
II – multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;
III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a entidade sancionadora, por prazo não superior a 2 (dois) anos.
Resta assim, conclusivo, que o sancionamento de suspensão do direito de licitar somente acarreta restrição na esfera do ente público emitente da sanção, não tendo esta sanção o caráter geral para a Administração Pública em todas as esferas, como é o caso da declaração de inidoneidade.
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[3] MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 218.
[2] SUNDFELD, 1994, p. 118.
[1] FURTADO, 2007, p. 451.